quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Brasil terá novo monitoramento de emissões de carbono

21 / 11 / 2013  Brasil terá novo monitoramento de emissões de carbono

O Ministério do Meio Ambiente aproveitou o começo das negociações decisivas da 19ª conferência mundial do clima da ONU, a COP-19, que vai até sexta em Varsóvia, para lançar uma plataforma de monitoramento de seus principais planos de redução de emissões de gases-estufa.
O objetivo da ferramenta é ser um termômetro da precisão do andamento dos cinco planos do país para atingir a meta de cortar entre 36,1% e 38,9% de suas emissões de carbono até 2020.
Os eixos principais são a prevenção do desmatamento da Amazônia e do cerrado, a geração de energia com fontes renováveis, o incentivo à agricultura de baixo carbono e incentivos e melhorias no uso de carvão vegetal na indústria de ferro e aço.
Batizado de SMMARE (Sistema Modular de Monitoramento de Ações e Redução de Emissões de Gases-Estufa), o projeto deve começar a funcionar no início de 2014.
transparência
Segundo o secretário de Mudanças Climáticas do ministério, Carlos Klink, a ferramenta deve aumentar o grau de transparência do andamento das ações para reduzir as emissões. Os dados deverão ser públicos.
“É um trabalho de um ano e meio. Um trabalho extenso que ficou maduro agora.”
O Brasil já faz um monitoramento das emissões setoriais, que fica a cargo do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, mas elas são feitas no âmbito do inventário de emissões, documento oficial que é produzido sem periodicidade definida, diferentemente do que se espera para o monitoramento do Ministério do Meio Ambiente.
Segundo Klink, com a plataforma, será possível identificar se as políticas para reduzir emissões estão funcionando e o que pode ser melhorado e corrigido.
Já foram investidos cerca de US$ 350 mil na ferramenta, e o governo estima que o custo de manutenção anual da alimentação da plataforma com os dados passará de US$ 2 milhões, dada a complexidade das informações.
“Mas é um dinheiro que vale a pena, que vai nos permitir saber com clareza como estão nossas reduções.”
A plataforma também foi pensada para ser usada pela chamada ICA, um mecanismo de consulta e análise internacional de dados.
Segundo o documento de apresentação, seria uma maneira “não intrusiva, não punitiva e que respeita a soberania nacional” de aumentar a transparência internacional sobre as ações do país. (Fonte: Folha.com).

Um país sem emissões de carbono: um sonho possível?

Um país sem emissões de carbono: um sonho possível?

Parece difícil imaginar que algum país populoso pode zerar emissões de gases efeito estufa e, consequentemente, ajudar a desacelerar o aquecimento global? Pois o Centro de Tecnologia Alternativa da Inglaterra garante que sim, no estudo “Zero Carbon Britain: Rethinking the Future”, lançado em julho deste ano.
O time responsável por esse documento – que reúne engenheiros, um físico, uma nutricionista, um cientista social, entre outros pesquisadores – não propõe retrocesso econômico ou político com base em “planos mirabolantes”, mas a aliança natural entre qualidade de vida da população e meio ambiente. Até porque, já é mais do que comprovado que para ser feliz por completo é preciso estar de bem com a natureza.
Não se trata, portanto, de parar de emitir. Basta reduzir as emissões e compensar o que não foi possível cortar. Por exemplo, em 2010 a Inglaterra emitiu 652.1 MtCO2; destas, 23.8 MtCO2 foram reabsorvidas – balanceando parte das emissões do país. Portanto, o saldo terminou em 628.3 MtCO2 negativos.
O objetivo do grupo é transformar o saldo final em nada mais que ZERO, sem depender de tecnologias em desenvolvimento. Ou seja, só foram levadas em conta tecnologias já existentes.
Investimentos em eficiência energética e energia renovável – especialmente eólica – foram apontados como fundamentais para alcançar essa meta. Hoje, a energia daquele país é responsável por 82% das emissões de gases de efeito estufa. Plantar florestas, enterrar materiais orgânicos e capturar e armazenar carbono também estão entre as medidas sugeridas para reabsorver os gases emitidos. (Fonte: Planeta Sustentável).

Pesquisadores investigam possíveis gatilhos ambientais para a doença ‘fogo selvagem"

Pesquisadores investigam possíveis gatilhos ambientais para a doença ‘fogo selvagem’

Por meio de uma parceria de mais de 25 anos, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill (Estados Unidos), analisam os fatores ambientais, genéticos e imunológicos que levam ao desenvolvimento da doença pênfigo foliáceo – popularmente conhecida como fogo selvagem na sua forma endêmica.
A enfermidade autoimune é caracterizada pela formação de bolhas por todo o corpo que, ao se romperem, podem servir de porta de entrada para infecções e culminar em sepse se não tratadas adequadamente.
As bolhas são resultado do ataque do sistema imunológico a uma proteína normalmente existente na camada mais superficial da epiderme denominada desmogleína 1 – que ajuda a manter as células da pele aderidas umas às outras. O ataque a uma proteína própria do organismo é resultado da desregulação do sistema imunológico e pode ser atribuído a inúmeros fatores.
Além de predisposição genética, o grupo de pesquisadores da USP e da UNC-Chapel Hill suspeita haver relação com a exposição constante a certos insetos hematófagos, particularmente o flebótomo (vetor da leishmaniose, popularmente conhecido como mosquito-palha), o triatomíneo (vetor da doença de Chagas conhecido como barbeiro) e o simulídeo (borrachudo).
Parte dos resultados obtidos nas últimas décadas foi apresentada durante a programação da FAPESP Week North Carolina, realizada em novembro, pelo professor do Departamento de Dermatologia da Escola de Medicina da UNC-Chapel Hill, Luis Diaz, e pela professora do Departamento de Dermatologia da Faculdade de Medicina da USP, Valéria Aoki.
“Temos evidências preliminares de que soros de pacientes com fogo selvagem reconhecem certas proteínas da glândula salivar de flebótomos. Se esse for realmente o caso, será a primeira doença autoimune em que podemos determinar a origem da autoimunidade”, afirmou Diaz.
De acordo com o pesquisador, o Grupo Cooperativo para Estudo do Fogo Selvagem surgiu em 1985 por iniciativa do professor da FMUSP, Sebastião de Almeida Prado Sampaio, morto em 2008. A pesquisa tem sido financiada há mais de duas décadas pelo National Institutes of Health (NIH), dos Estados Unidos.
Nos anos 1980, o grupo conseguiu identificar os anticorpos responsáveis pelo ataque à desmogleína 1 e isolar o principal deles: o IgG4. “Purificamos o anticorpo IgG4 do soro de pacientes de fogo selvagem e injetamos em camundongos, desenvolvendo um modelo animal para estudo da doença. Agora estamos usando novas técnicas e já chegamos a 97% de pureza. A ideia é injetar esse anticorpo purificado no camundongo e tentar descobrir qual porção específica da molécula é atacada”, contou Diaz.
O Grupo Cooperativo para Estudo do Fogo Selvagem desenvolve também estudos no âmbito epidemiológico para desvendar possíveis fatores ambientais. O centro da investigação é a aldeia indígena Terena de Limão Verde, localizada em Aquidauana, no Mato Grosso do Sul.
“É uma região em que a doença é endêmica, chegando a afetar 3,4% dos habitantes, prevalência muito alta para uma condição autoimune. Nas demais partes do mundo, existem apenas casos esporádicos”, contou Aoki.
Os doentes e a população não acometida pelo fogo selvagem da aldeia têm sido acompanhados pelo grupo há 20 anos, por meio de exame clínico e controle sorológico. Foi em um desses estudos que os pesquisadores constataram que, no soro de doentes de fogo selvagem, existem anticorpos que reconhecem proteínas presentes na saliva do flebótomo.
“Uma das hipóteses é que a saliva do inseto, na hora da picada, possa modificar a estrutura da desmogleína 1, facilitando, por exemplo, a exposição de parte da molécula normalmente oculta. Ou talvez possa injetar algo que mimetize a desmogleína 1, desencadeando a autoimunidade”, explicou Aoki.
Mas se todos os moradores da aldeia estão expostos a picadas constantes de insetos hematófagos, por que apenas alguns desenvolvem a doença? Uma das possibilidades, de acordo com a pesquisadora, é a existência de uma sequência específica de genes no sistema antígeno leucocitário humano (HLA, na sigla em inglês) – responsável por codificar proteínas envolvidas na resposta imune – que torna a pessoa predisposta.
“Durante os estudos de vigilância clínico-epidemiológica, descobrimos algo inesperado: soros de indivíduos que moravam na aldeia e não manifestavam a doença também possuíam anticorpos contra a desmogleína-1. E, quanto mais distante da aldeia, menor a chance de encontrarmos anticorpos anti-desmogleína 1 no soro dos indivíduos sem a doença. Isso reforça a importância do estímulo ambiental no desenvolvimento da autoimunidade”, avaliou Aoki.
De acordo com a pesquisadora, os resultados têm despertado grande interesse na comunidade científica, pois podem ajudar a entender o mecanismo de funcionamento de outras doenças autoimunes, como lúpus e artrite reumatoide. “Talvez outras enfermidades possam sofrer influência de estímulos ambientais”, disse Aoki. (Fonte: Agência Fapesp).

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Artigo: Equívocos do senso comum Eratóstenes Lima* e Renato Dagnino*

Equívocos do senso comum
Eratóstenes Lima* e Renato Dagnino*

Intencionando uma abordagem clara e pragmática pretendemos, com uma série de pequenos artigos denominados “Série Equívocos do senso comum”, contribuir para o esclarecimento público acerca de temas de interesse coletivo, especialmente neste momento histórico em que a sociedade brasileira exibe seu clamor nas ruas por mudanças na ordem político-institucional.
Não pretendendo esgotar o tema, nesta primeira apresentação trataremos dos
significados de “senso comum”, e de como a mídia, especialmente a TV aberta, pauta o conteúdo das discussões na sociedade, apresentando com seu insistente discurso uma cadeia de leituras e interpretações da realidade, “selecionadas e editadas” de acordo com os interesses dos grupos econômicos e políticos detentores desta cadeia de mídia, representada no Brasil por apenas nove famílias que, de forma absolutamente intencional, “desinformam” a sociedade a cada dia.
O Vocabulário técnico e crítico da Filosofia de Lalande apresenta, entre outras
concepções sobre senso comum, uma que nos chama a atenção: [...] o senso comum é o conjunto das opiniões tão geralmente admitidas numa época e num meio dado, que as opiniões contrárias aparecem como aberrações individuais, que será inútil refutar seriamente e das quais é melhor rir, se forem fúteis, mas que será melhor debater seriamente se forem graves.
A definição do senso comum como o conjunto das opiniões tão admitidas numa época e num meio dado que as opiniões contrárias aparecem como “aberrações individuais” mostra a busca pela homogeneização das opiniões que circulam pelo social, sendo que o que sai do comum, as opiniões adversas são vistas como aberrações. E, por meio desse ponto de vista, observamos uma delimitação para que a configuração da heterogeneidade, para o espaço do diferente e aceitação deste, já que o que é visto como aberração é posto à margem da sociedade. Geertz (1983), diz que o senso comum coloca os dizeres de maneira literal, sendo apenas aquilo e não outra coisa, ou seja, os sentidos que constituem o senso comum não tendem para o deslizamento, para o deslocamento (polissemia) e sim para a estabilidade, para a repetição (paráfrase), o que reafirma esse desejo pelo mesmo, pelo estável, pelo comum.
Importante ressaltar ainda que o senso comum “resolve” as discussões com meras alegações, não com evidências concretas (aí seria exigir demais, pois pesquisa séria cansa - e já deixaria de ser senso comum), e não se baseia em métodos ou conclusões científicas, e sim no modo comum e espontâneo de assimilar informações e conhecimentos úteis no cotidiano: uma herança cultural que tem a função de orientar a sobrevivência humana nos mais variados aspectos. Os equívocos de definição levam ao senso comum julgar "espectros" idealizados, e não fatos concretos. Pode-se dizer, de forma simplificada, que é comum ao senso comum falar de coisas de que não entende.
A questão ideológica é, em si, outra panacéia. Para mostrar nossa pretensa "criticidade" em relação a algo, basta lançar a acusação de "comprometimento ideológico". Essa talvez seja a mais absoluta de todas as panacéias, pois não imaginamos neste momento onde não se a possa aplicar a existência de ideologias, das mais diversas, nas opiniões que se formam no seio da sociedade.
  
Professor Eratóstenes de Almeida Fraga Lima: Engenheiro Sanitarista (UFBA), Especialista em Gestão Estratégica Pública (Unicamp), Mestrando em Ecologia Aplicada à Gestão Ambiental (UFBA). CV: http://lattes.cnpq.br/4798824200048282 Professor Renato Dagnino: Titular do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT), do Instituto de Geociências na Universidade Estadual de Campinas, Pós-doutor pela Universidade de Sussex - Inglaterra. CV:
http://lattes.cnpq.br/0864711435393000

Vejamos como exemplo a "lógica de futebol": se nosso time perdeu certamente é porque houve roubo - ou alguém foi comprado - ou então os assistentes do jogo, como juízes, bandeirinhas, etc., tem "comprometimento ideológico" com o time adversário, e o mesmo se aplica aos julgadores deste ou daquele caso.
Trata-se de um nível menos patológico da chamada "teoria da conspiração".
Imaginamos que há de fato os que acreditam nessa argumentação, mas é de fato uma questão de fé, um dogma, uma vez que não é possível provar o contrário - ainda que se tenha como provar o contrário - mas a evidência poderá ser questionada em sua credibilidade enquanto fonte, ou então ser mais um caso de "comprometimento ideológico". De qualquer forma, não é incomum que uma mesma pessoa ou entidade seja acusada de "comprometimento" (ideológico ou por corrupção) mesmo em relação a
ideologias opostas (conforme o interesse do acusador).
Assim, as formulações que constituem o senso comum são produzidas historicamente, buscando a estabilidade, a normalidade, a circulação do mesmo no meio social.
Pêcheux (1999), afirma que “a história não é outra coisa do que a resultante de uma série de situações de interações reais ou simbólicas (...)”, e o senso comum constitui-se no simbólico, na relação entre língua e história, significando-se nessa interação como uma força normalizadora e coercitiva (LAGAZZI, 1988). E na estabilização e naturalização dos dizeres e das opiniões há um desejo de não romper com fronteiras visíveis e invisíveis, tornando tudo uma coisa una e indivisível.
Desse modo, é pelo funcionamento da ideologia que apagamos os outros sentidos e significados, e que “silenciamos” a polissemia. Esse apagamento da polissemia como sendo da instância do senso comum, pode-se considerar como sendo una e indivisível, sujeita também a generalizações, e faz parte do senso comum dizer que todos os políticos são ladrões, que precisamos salvar a natureza, ou seja, opiniões aceitas e convenções estabelecidas (PRADO JR, 1979).
Há evidentemente aí a produção do imaginário de verdades absolutas, propaladas pela mídia, que promove a ideologização de seus interesses na sociedade.
Nessa linha tênue e invisível presente no sistema capitalista, a homogeneização das opiniões, das idéias, nos dizeres do senso comum consolidam-se barreiras numa relação por vezes contraditória, já que o senso comum, ao tender para a estabilidade, para o mesmo, para o não deslocamento de sentidos, nega um posicionamento revolucionário no âmbito social devido à falta de um desejo por mudança e pelo diferente. Isso ocorre porque os valores sociais “pré-construídos” reproduzem e sustentam tal discursividade, constituindo, assim, uma memória discursiva sem diferenças, que possuem a característica de apregoar a mesma opinião sobre todos os assuntos.
Se há uma polissemia intrínseca, silenciada por um movimento da ideologia proclamada pela mídia, também pode haver a polissemia nos dizeres do senso comum, silenciados também por um trabalho da ideologia, naturalizando, dessa forma, preceitos, idéias e opiniões. É, talvez, nesse apagamento que pode haver a presença de uma barreira, tênue e quase imperceptível: a barreira social daqueles que definem o que será considerado como senso comum em uma sociedade. Quais vozes são silenciadas nos dizeres do senso comum? Quais sentidos são silenciados para que outros adquiram significado? O que é reiterado nesses dizeres?
O senso comum e a ciência são expressões da mesma necessidade básica, a
necessidade de compreender o mundo, a fim de viver melhor e sobreviver. Para aqueles que teriam a tendência de achar que o senso comum é inferior à ciência, lembramos que, por dezenas de milhares de anos, os homens sobreviveram sem coisa alguma que se assemelhasse à nossa ciência, que tem apenas três séculos de existência.
O senso comum e a ciência partem do mesmo princípio: a necessidade do homem de compreender o mundo e a si mesmo. O ser humano, por milhares de anos, viveu numa sociedade em que não havia ciência e mesmo assim deu continuidade ao processo de evolução. É preciso compreender que sendo a ciência um “refinamento” do senso comum, devemos então respeitá-lo e não desprezá-lo, já que esse serve de ponto de partida para aquela.
Mas uma questão fundamental se faz necessária: quais são as mudanças necessárias no pensamento para que seja possível a compreensão do novo?
O atual contexto político, pródigo em incertezas, grande desorientação, muita desilusão e não menor insatisfação, é propício também, e talvez por isso mesmo, à aceitação fácil das falsas evidências com que a mídia e os poderes instituídos a serviço do capital contam para o eficaz controle ideológico da sociedade. Apresentadas sob a forma de raciocínios simplistas e enraizadas na opinião pública por pressão constante dos ‘fazedores de opinião’, fazem parte do esquema mental que nos pretendem incutir de não haver alternativa social às ‘inevitáveis’ soluções do mercado. Tudo é feito, pois, em nome do mercado. [Talvez os mais jovens não se lembrem, ou nem mesmo tiveram
oportunidade de refletir criticamente sobre, mas na década de 90, no Brasil, a reforma neoliberal, de conseqüências tão maléficas para a soberania nacional e o povo brasileiro, foi apregoada pelos governos Collor e FHC, e até (pasmem) defendida pelos que mais tinham a perder com ela].
Nesta oportunidade vamos destacar dois dos equívocos que vêm pautando o quotidiano dos debates atuais na sociedade brasileira, e que nos importa “desmontar”, até porque deles invariavelmente se extraem consequências ou assentam medidas cuja necessidade pretende a mídia justificar (quando não mesmo impor) como evidências naturais e inevitáveis:
O primeiro pretende que tudo o que acontece de mau no país é da responsabilidade do Governo e, por extensão, do Estado. Isso significaria então que bastaria uma simples mudança do Governo para que tudo mude ou, pelo menos, melhore.
O segundo diz respeito à origem da desgraça: tudo, afinal, se resume às atávicas diferenças de produtividade com os nossos concorrentes ou parceiros. Logo, conclui-se, o que importa é desvalorizar o trabalho tanto quanto for necessário para nos podermos equiparar (ou pelo menos aproximar) aos nossos mais diretos competidores.
Um dos temas dominantes na contemporaneidade é o papel que o Estado deve
desempenhar nas sociedades modernas, referência obrigatória nas análises efetuadas sobre as múltiplas questões sociais. O papel do Estado é avocado tanto para se evidenciar a sua necessidade imperiosa nas políticas públicas, ou a sua dimensão desmesurada, quanto para acentuar sua imprescindível função regulatória de que não se pode prescindir, e o crescente peso advindo das inúmeras funções sociais, antes reservadas ao estrito âmbito da assistência meramente “filantrópica”.
Não admira, pois, que quando se trata de encontrar explicação para os problemas atuais, que os olhos se virem, inevitavelmente, para os governantes atuais, considerados, em última análise, como os causadores de todas as desgraças que acontecem. Não deixa de haver algum fundamento nesta simplificação, pois que se firma na perspectiva, afinal bem razoável, de que as escolhas políticas deveriam ter capacidade para impor os seus pontos de vista sobre as restantes componentes da vida, na ilusão de que aos cidadãos-eleitores, através dos seus eleitos, caberia orientar e controlar politicamente os diferentes aspectos sociais, incluindo a economia. Como sabemos, não é assim que acontece.
O que se estabelece, no presente momento, no debate baseado no senso comum, desconsidera a análise do contexto histórico, político e social, do jogo de poder, dos interesses da burguesia nacional em manter seus privilégios e nos interesses do capital internacional.
Não temos intenção nesta primeira abordagem de tratar de tantos temas, que requerem um aprofundamento maior, mas entendemos ser imperioso afirmar que infelizmente temos, no Brasil, um Estado cativo a um sistema econômico que tudo comanda e que efetivamente governa. Com efeito, são os ‘mercados’, mais que quaisquer políticas ou tendências ideológicas, que ditam as soluções a adotar e as medidas a tomar. Que definem as regras e traçam os limites, que concedem as benesses de uma expansão econômica ou impõem os danos das restrições financeiras. Em suma, que elegem os beneficiados (o capital e a burguesia) e designam os punidos (a sociedade).
Recomendamos assistir ao Jornalista Paulo Henrique Amorim:
1. Palestra na abertura da Etapa Bahia da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, na FLEM (CAB), em Salvador, em 14/11/2009.
(1ª Parte): https://www.youtube.com/watch?v=BM99kvcc6NQ
(2 ª Parte): https://www.youtube.com/watch?v=LcWU9RLSj9M
(3 ª Parte): https://www.youtube.com/watch?v=PeC0tiIC5Wg
(4 ª Parte): https://www.youtube.com/watch?v=98P9VAY15u0
2. Falando do PIG (partido da imprensa golpista), disponível em


Nota dos Autores: nas próximas edições abordaremos em nossos artigos temas
como:
- ‘Transformar conhecimento em riqueza’ ou transformar conhecimento em inclusão?
- Educação e desigualdade social.
- Por que nossos impostos não geram o estado de bem estar social que almejamos?
- Tecnologia Social e Economia Solidária: uma perspectiva para transformação.
- Gestão Pública para a cidadania.
- Estado Herdado e Estado Necessário.
- O Estado deve planejar ou resolver problemas?, dentre outros


Observação da Blogueira: Contato do colega:
Professor Eratóstenes de Almeida Fraga Lima - Toza Lima
Engenheiro Sanitarista
Especialista em Gestão Estratégica Pública
Tel: 55 - 71 - 8152-3451
Toza Lima" <tozalima.ufba@gmail.com

segunda-feira, 3 de junho de 2013

05 de junho - Dia Mundial do Meio Ambiente

05 de junho - Dia Mundial do Meio Ambiente
  O Dia Mundial do Meio Ambiente foi  estabelecido pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1972, marcando a abertura da Conferência de Estocolmo sobre Ambiente  Humano.

 Celebrado anualmente desde então no dia 5 de  Junho, o Dia Mundial do Meio Ambiente reunir a atenção e a ação política de povos e países para aumentar a conscientização e a preservação ambiental.

Dessa forma, os principais objetivos das comemorações são:

·         Mostrar o lado humano das questões ambientais;
·         Capacitar as pessoas a se tornarem agentes ativos do desenvolvimento sustentável;
·         Promover a compreensão de que é fundamental que comunidades e indivíduos mudem atitudes
em relação ao uso dos recursos e das questões ambientais;
·         Advogar parcerias para garantir que todas as nações e povos desfrutem um futuro mais seguro e mais próspero.


Debate sobre Rio+20 e Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis

Semana do Meio Ambiente abre espaço para debate sobre Rio+20 e Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis

TINNA OLIVEIRA

A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, abre, nesta segunda-feira (03/06), às 9h, as comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente, com uma programação que se desenvolverá ao longo da semana. Em seguida, acontecerá o debate “A Geopolítica do Desenvolvimento Sustentável”. O evento concentrará as atividades no Jardim Botânico do Rio de Janeiro e reunirá representantes de organizações governamentais e não governamentais, organismos internacionais, setor privado e academia. 

Será, na opinião da ministra, uma oportunidade para que especialistas e sociedade civil possam debater o Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis (PPCS), que tem como proposta assegurar vida plena e digna para todos. Visa, também, relembrar os compromissos assumidos pelo Brasil e outros países, em 2012, na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). 

“A expectativa é poder detalhar melhor, discutir mais o PPCS e criar alternativas para avançar, a fim de alcançar o objetivo final que é o de entregar medidas institucionais, processos de capacitação, decisões e acordos setoriais que visem à sustentabilidade”, destaca a secretaria de Articulação Institucional e Cidadania do Ministério do Meio Ambiente, Mariana Meirelles.

PROGRAMAÇÃO

O evento será dividido em duas partes. Durante a manhã, haverá painéis sobre contratações públicas, construção e varejo, atividades que levam em conta a sustentabilidade. “É importante trabalhar critérios de sustentabilidade que possam ser úteis, por exemplo, nas construções públicas e privadas”, diz Mariana Meirelles. “Esse tema e muitos outros serão debatidos, juntamente com nossos parceiros”.

No período da tarde, acontecerão oficinas sobre consumismo infantil, embalagens e meio ambiente, estilo de vida sustentável, relatórios de sustentabilidade nas empresas, cadeia produtiva da construção, compras públicas sustentáveis e os setores industriais. Todas essas questões ambientais discutidas visam garantir um futuro mais justo e sustentável para o Brasil.

Mais informações no hotsite do evento.

EVENTOS PARALELOS
Outros eventos em comemoração à data acontecem em Brasília. Na quinta-feira (06/06), às 9h30, o Ministério do Meio Ambiente promove, juntamente com a Câmara dos Deputados, o seminário sobre os Desafios para a Implementação da Lei dos Resíduos Sólidos, no Anexo II da Câmara (confira a programação completa aqui). O evento marca a mobilização em torno da IV Conferência Nacional do Meio Ambiente (CNMA), que acontece de 24 a 27 de outubro, em Brasília.

O evento também serve como etapa preparatória para a conferência virtual que acontecerá entre 26 de agosto e 10 de setembro. Além disso, a Câmara, por meio da Comissão do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e do e-Democracia é parceira do MMA na organização da conferência virtual. O evento discutirá os quatro eixos temáticos da conferência: Produção e Consumo Sustentáveis; Redução dos Impactos Ambientais; Geração de Trabalho, Emprego e Renda; e Educação Ambiental.

EDUCAÇÃO AMBIENTAL

O MMA também comemora o Dia da Educação Ambiental, 3 de junho, com duas programações. O Departamento de Educação Ambiental, com o apoio do Governo do Distrito Federal, prepara uma Sala Verde Especial nos jardins em frente ao edifício sede do órgão, localizado na Esplanada dos Ministérios. A sala, com materiais e vídeos educativos socioambientais, será aberta ao público a partir das 14h e permanece até o dia 7 de junho. 

Em parceria com o Ministério da Educação (MEC) e a Universidade de Brasília (UnB), o MMMA também promove o 2° Painel de Debates sobre Educação Ambiental, no auditório 2 Candangos, da UnB. Será discutido o papel da Educação Ambiental na construção da sustentabilidade universitária. Para participar do debate, inscreva-se aqui


SAIBA MAIS
Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco receberá R$23,8 milhões para atividades de fomento e implantação de parques

Fonte:http://www.mma.gov.br/informma/item/9366-vida-digna-para-todos

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Julius Richard Petri (bacteriologista alemão)

Homenageio hoje o médico bacteriologista alemão Julius Richard Petri, que nasceu em 31 de maio de 1852 em Barmen na Alemanha, inventor da Placa de Petri e que hoje estaria completando o seu 161º aniversário. 

Petri, estudou medicina na Kaiser-Wilhelm, academia para Médicos Militares (1871 - 1875) e recebeu o diploma de medicina em 1876. Continuou os estudos no Hospital Charité em Berlim e serviu como médico militar até 1882, continuando como reservista posteriormente. Entre 1877 e 1879, foi designado para o Gabinete Imperial de Saúde em Berlim, onde se tornou assistente de Robert Koch.


A placa de Petri é um recipiente de vidro ou plástico que é utilizado para cultivar micro-organismos e foi inventada enquanto trabalhava como assistente do médico e bacteriologista alemão, Robert Koch em 1877. De forma geral, nessa placa é colocada um tipo de caldo líquido onde estão misturados alguns nutrientes, sais e aminoácidos a depender do que se quer observar e das necessidades específicas do metabolismo do micróbio a estudar. Com o uso dessa placa foi possível identificar e entender melhor as bactérias patogênicas. Petri faleceu em 20 de dezembro de 1921, Zeitz, Alemanha.

terça-feira, 28 de maio de 2013

Teorias de la GLOBALIZACIÓN. OCTAVIO IANNI

PREFÁCIO:
A globalização está presente na realidade e no pensamento, desafiando a muitos em todo o mundo. Apesar das vivências e opiniões de uns e outros, a maioria reconhece que esta problemática está presente na forma por meio da qual se desenha o novo mapa do mundo, no real e no imaginário.
Já são muitas as teorias empenhadas em esclarecer as condições e os significados da globalização. Umas com certa timidez, ao passo que outras com bastante audácia; algumas vezes se desconhecem mutuamente e outras se influem. Porém todas abrem perspectivas ao esclarecimento das configurações e os movimentos da sociedade global.
Vale a pena mapear as principais teorias da globalização. Permitem esclarecer não apenas as condições em que se formam a sociedade global, mas também os desafios são criados para as sociedades nacionais. Os horizontes que se abrem com a globalização, em termos de integração, podem abrir novas perspectivas para a interpretação do presente, para releitura do passado e para imaginação do futuro.
A problemática da globalização implica naturalmente um diálogo múltiplo, com autores e interlocutores, em diferentes perspectivas históricas e teóricas. Em grande proporções este diálogo e está registrado neste livro, nas referencias e nas citações.
Alguns dos temas foram apresentados em encontros intelectuais, geralmente em ambientes universitários. E alguns capítulos foram publicados em versões preliminares: “Metáforas da Globalização”, Ideias, ano I, número 1, Campinas, Unicamp, 1994; “A ocidentalização do mundo”, com o título “A modernização do Mundo”, Margem, número 3, São Paulo, PUC, 1994, São Paulo, 30 de outubro de 1994; “Sociologia da Globalização”, com o título “Globalização: Novo Paradigma das Ciências Sociais”, Estudos avançados, Número 21, São Paulo, USP, 1994. Foram momentos importantes do diálogo múltiplo, polifônico, que me permitiram aperfeiçoar a reflexão e a narração.
OCTAVIO IANNI, São Paulo, 10 de janeiro de 1995.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Artigo: O imperialismo da razão neoliberal por Pierre Bourdieu e Löic Wacquan

O imperialismo da razão neoliberal
por Pierre Bourdieu e Löic Wacquant [*]

http://resistir.info/franca/imagens/camara_escura.gifEm todos os países avançados, patrões, altos funcionários internacionais, intelectuais de projeção nos media e jornalistas do top, estão de acordo em falar uma estranha novilíngua [1] cujo vocabulário, aparentemente sem origem, circula por todas as bocas: “globalização”, “flexibilidade”, “governabilidade” e “em-pregabilidade”, “underclass” e “exclusão”, “nova economia” e “tolerância zero”, “comunitarismo” [2] , “multiculturalismo” e os seus primos “pós-modernos”, “etnicidade”, “minoridade”, “identidade”, “fragmentação”, etc.

A difusão dessa nova vulgata planetária – da qual se encontram notavelmente ausentes capitalismo, classe, exploração, dominação, desigualdade, e tantos vocábulos decisivamente revogados sob o pretexto de obsolescência ou de uma presumível falta de pertinência – é produto de um imperialismo apropriadamente simbólico: os seus efeitos são tão poderosos e perniciosos porque ele é veiculado não apenas pelos partidários da revolução neoliberal - a qual, sob a capa da “modernização”, entende reconstruir o mundo fazendo tábua rasa das conquistas sociais e econômicas resultantes de cem anos de lutas sociais, descritas agora como arcaísmos e obstáculos à nova ordem nascente –, mas também por produtores culturais (pesquisadores, escritores, artistas) e militantes de esquerda que, na sua maioria, continuam a considerar-se progressistas.

IMPERIALISMO CULTURAL 

Como as dominações de gênero e etnia, o imperialismo cultural constitui uma violência simbólica que se apóia numa relação de comunicação coerciva para extorquir a submissão e cuja particularidade consiste, neste caso, no fato de universalizar particularismos vinculados a uma experiência histórica singular, ao fazer com que sejam desconhecidos enquanto tal e reconhecidos como universais .

Desta forma, também no século XIX muitas questões ditas filosóficas que eram debatidas em toda a Europa, como o tema spengleriano da “decadência”, partiam de particularidades e conflitos históricos próprios do universo específico dos universitários alemães [4] , da mesma forma que hoje, inúmeros tópicos provenientes de confrontos intelectuais ligados a particularidades e particularismos da sociedade e das universidades norte-americanas se impuseram, aparentemente fora de um contexto histórico, ao conjunto do planeta.

Definições e deduções. Esses lugares-comuns, no sentido aristotélico de noções ou teses que servem de argumento sobre as quais não se argumenta, devem o essencial da sua força de convicção ao prestígio do seu ponto de partida e ao fato de que, ao circularem continuamente entre Berlim e Buenos Aires ou de Londres a Lisboa, estarem simultaneamente em toda parte e serem poderosamente transmitidos por essas instâncias supostamente neutras do pensamento neutro que são os grandes organismos internacionais. Instâncias como o Banco Mundial, a Comissão Européia, a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômicos (OCDE), enfim, os “bancos de idéias” do pensamento conservador (o Manhattam Institute, em Nova York, o Adam Smith Institute, em Londres, a ex-Fondation Saint-Simon, em Paris, a Deutsche Bank Fundation, em Frankfurt), as fundações de filantropia, as escolas do poder (Science-Politique, em França, a London School of Economics, na Inglaterra, a Harvard Kennedy School of Government, nos Estados Unidos, etc.) e os grandes meios de comunicação, divulgadores infatigáveis dessa língua geral, sem fronteiras, perfeita para dar a ilusão de ultramodernismo aos editorialistas apressados e especialistas ciosos da importação-exportação cultural.

Além do efeito automático da circulação internacional das idéias que, pela sua própria lógica, tende a ocultar as condições e os significados originais , o jogo das definições prévias e deduções escolásticas substitui a contingência das necessidades sociológicas negadas pela aparência da necessidade lógica e tende a ocultar as raízes históricas de todo um conjunto de questões e de noções: a “eficácia” do mercado (livre), a necessidade de reconhecimento das “identidades” (culturais), ou ainda a reafirmação-celebração da “responsabilidade” (individual), que serão decretadas filosóficas, sociológicas, econômicas ou políticas, segundo o lugar e o momento de recepção.

A MITOLOGIA DO “SONHO AMERICANO” 

Planetarizados, globalizados, no sentido estritamente geográfico, e ao mesmo tempo desparticularizados, esses lugares-comuns, ao serem ruminados pelos meios de comunicação transformam-se num senso comum universal, fazendo esquecer que, na maioria das vezes, eles apenas exprimem - de forma truncada e irreconhecível, até por aqueles que os propagam - realidades complexas e contestadas de uma sociedade histórica particular, tacitamente constituída em modelo e na medida de todas as coisas: a sociedade norte-americana da era pós-fordista e pós- keynesiana. Esse único superpoder, essa Meca simbólica da Terra, caracteriza-se pelo desmantelamento deliberado do Estado social e pelo hiper-crescimento correlativo do Estado penal, o esmagamento do movimento sindical e a ditadura da concepção de empresa fundada apenas no “valor-acionário”, assim como nas suas conseqüências sociológicas: a generalização dos salários precários e da insegurança social, transformada em motor privilegiado da atividade econômica.

É o que ocorre, por exemplo, com o debate vago e fraco em torno do “multiculturalismo”, termo importado, na Europa, para designar o pluralismo cultural na esfera cívica, enquanto nos Estados Unidos se refere, no interior do próprio movimento pelo qual ele os mascara, à exclusão contínua dos negros e à mitologia nacional do “sonho americano” da “oportunidade para todos”, correlativa da falência que afeta o sistema do ensino público num momento em que a competição pelo capital cultural se intensifica e quando as desigualdades de classe crescem vertiginosamente.

A DEMISSÃO DO ESTADO 

O adjetivo “multicultural” encobre essa crise ao confiná-la, artificialmente, apenas no microcosmo universitário e ao expressá-la num registro ostensivamente “étnico”, quando o seu verdadeiro desafio não é o reconhecimento das culturas marginalizadas pelos cânones acadêmicos, mas antes o acesso aos instrumentos de (re)produção das classes médias e superiores, como a universidade, num contexto de demissão ativa e massiva do Estado.

O “multiculturalismo” americano não é nem um conceito nem uma teoria, nem um movimento social ou político – ainda que pretenda ser tudo isso ao mesmo tempo. É um discurso-écran cujo estatuto intelectual resulta de um gigantesco efeito de alodoxia [6] nacional e internacional que engana tanto aqueles que estão nele como os que não estão. Além do que é um discurso norte-americano, embora pense e se apresente como universal, ao exprimir as contradições específicas da situação de universitários que, afastados de qualquer acesso à esfera pública e submetidos a uma forte diferenciação no seu meio profissional, não têm outro terreno onde investir a sua libido política fora das disputas de campus disfarçadas de epopéias conceituais.

AS DELÍCIAS DO “RECONHECIMENTO CULTURAL” 

O que significa que o “multiculturalismo” leva consigo, para onde quer que seja exportado, três vícios do pensamento nacional norte-americano que são, (a) o “grupismo”, que reifica as divisões sociais, canonizadas pela burocracia estatal, em princípios do conhecimento e da reivindicação política; (b) o populismo, que toma o lugar da análise das estruturas e dos mecanismos de dominação pela celebração da cultura dos dominados e do seu “ponto de vista” - elevado ao nível de prototeoria em ação; (c) o moralismo, que é um obstáculo à aplicação de um materialismo racional sadio na análise do mundo social e econômico, condenando-nos a um debate sem efeito nem fim sobre o necessário “reconhecimento das identidades” enquanto, na triste realidade do quotidiano, o problema não se situa de forma alguma nesse nível [7] . Enquanto os filósofos se deliciam doutamente com o “reconhecimento cultural”, dezenas de milhares de crianças de classes e etnias dominadas são excluídas das escolas primárias por falta de vagas (eram 25.000 só este ano, na cidade de Los Angeles), e um jovem em cada dez provenientes de famílias que ganham menos de 15.000 dólares anuais tem acesso aos campi universitários, contra 94% das crianças de famílias que dispõem de mais de 100 000 dólares.

Poder-se-ia fazer a mesma demonstração a propósito da noção fortemente polissêmica de “globalização”, que tem como efeito, se não como função, vestir de ecumenismo cultural ou de fatalismo economista os efeitos do imperialismo norte-americano e de fazer aparecer uma relação de força transnacional como uma necessidade natural. No termo de um retorno simbólico baseado na naturalização dos esquemas do pensamento neoliberal cuja dominação se impõe há vinte anos graças ao trabalho dos think tanks (bancos de idéias) conservadores e dos seus aliados nos campos político e jornalístico [8] , a moldagem das relações sociais e das práticas culturais conforme o padrão norte-americano, imposta às sociedades avançadas através da pauperização do Estado, mercantilização dos bens públicos e generalização da insegurança salarial, é aceita com resignação como resultado obrigatório das evoluções nacionais, quando não é celebrada com um entusiasmo de carneirinhos. A análise empírica da evolução das economias avançadas de longa duração sugere no entanto que a “globalização” não é uma nova fase do capitalismo, mas antes uma “retórica” invocada pelos governos para justificar a sua submissão voluntária aos mercados financeiros. A desindustrialização, o crescimento das desigualdades e a contradição das políticas sociais, longe de serem a conseqüência fatal do crescimento das trocas externas, como habitualmente se diz, resultam de decisões de política interna que refletem a mudança das relações de classe a favor dos proprietários do capital [9] .

A REFORMATAÇÃO DO MUNDO 

Ao imporem ao resto do mundo categorias de percepção homólogas às suas estruturas sociais, os Estados Unidos reformatam o mundo à sua imagem: a colonização mental operada através da difusão desses verdadeiros-falsos conceitos apenas pode conduzir a uma espécie de “Consenso de Washington” generalizado, e até espontâneo, como se pode observar correntemente em matéria de economia, de filantropia ou de ensino de. Efetivamente, esse discurso duplo fundamentado na crença que imita a ciência, sobrepondo ao fantasma social do dominante a aparência da razão (especialmente econômica e politológica), é dotado do poder de realizar realidades que pretende descrever segundo o princípio da profecia auto-realizadora: presente nos espíritos daqueles que tomam decisões políticas ou econômicas e de seus públicos, ele serve de instrumento de construção de políticas públicas e privadas, ao mesmo tempo que é instrumento de avaliação dessas políticas. Como todas as mitologias da idade da ciência, a nova vulgata planetária apóia-se numa série de oposições e equivalências, que se sustentam e contrapõem, para descrever as transformações contemporâneas das sociedades avançadas: desenvestimento econômico do Estado e ênfase nas suas componentes policiais e penais, desregulação dos fluxos financeiros e desorganização do mercado de trabalho, redução das proteções sociais e celebração moralizadora da “responsabilidade individual”: 
MERCADO
ESTADO
liberdade
coerção
aberto
fechado
flexível
rígido
dinâmico, móvel
imóvel, paralisado
futuro, novidade
passado, ultrapassado
crescimento
imobilismo, arcaísmo
indivíduo, individualismo
grupo, coletivismo
diversidade, autenticidade
uniformidade, artificialidade
democrático
autocrático ("totalitário")
O imperialismo da razão neoliberal encontra a sua realização intelectual em duas novas figuras exemplares da produção cultural. Primeiramente o especialista que prepara, na sombra dos bastidores ministeriais ou patronais ou no segredo dos think tanks (bancos de idéias), documentos de um forte cunho técnico, e tanto quanto possível construídos em linguagem econômica e matemática. De seguida, o conselheiro em comunicação do príncipe, trânsfuga do mundo universitário agora ao serviço dos dominantes, cujo serviço é dar forma acadêmica aos projetos políticos da nova nobreza de Estado e da empresa. O modelo planetário e incontestado é o do sociólogo britânico Anthony Giddens, professor da Universidade de Cambridge, agora à frente da London School of Economics e pai da “teoria da estruturação”, síntese escolástica de diversas tradições sociológicas e filosóficas.

UM CAVALO DE TRÓIA DE DUAS CABEÇAS 

Pode perceber-se a encarnação por excelência do estratagema da razão imperialista no fato de que é a Grã-Bretanha, posta por razões históricas, culturais e lingüísticas em posição intermediária, neutra, entre os Estados Unidos e a Europa continental, que fornece ao mundo esse cavalo de Tróia de duas cabeças — uma política e a outra intelectual — na pessoa dual de Anthony Blair e Anthony Giddens, “teórico” autoproclamado da “terceira via”, que afirma, textualmente, que “adoto uma atitude positiva em relação à globalização”; “tento [sic] reagir às novas formas de desigualdades”, advertindo logo, porém, que “os pobres de hoje não são semelhantes aos de ontem, (...) assim como os ricos não se parecem mais com aqueles que no passado o foram”; “aceito a idéia de que os sistemas de proteção social existentes, e a estrutura do conjunto do Estado, são a fonte dos problemas, e não apenas a solução para resolvê-los”; “enfatizo o fato de que as políticas econômicas e sociais se encontram relacionadas”, para afirmar ainda que “as despesas sociais devem ser avaliadas ao nível das suas conseqüências para a economia no seu conjunto”, e, finalmente, “preocupo-me com os mecanismos de exclusão” que descobre “na base da sociedade, mas também no topo [sic]”, convencido de que “redefinir a desigualdade em relação à exclusão nesses dois níveis” é “conforme a uma concepção dinâmica da desigualdade” [10] .

Os mestres da economia podem dormir tranqüilos pois encontraram o seu Pangloss.

Notas

[1] Referência a “1984”, de George Orwell. Designa o uso de termos que desconsideram o vocabulário corrente e produzem termos que tornam hermética a compreensão do fenómeno relatado. Isso se dá na esfera política e filosófica.
[2] Comunitarismo é um conceito teorizado por Charles Taylor, Michael Walzer, Alasdair McIntyre. Valoriza a comunidade como um bem em si, assim como a igualdade e a liberdade, sendo o espaço no qual os indivíduos podem se exprimir, partilhar valores. Os seus críticos vêem nesse conceito a teorização dos guetos.
[3] É bom deixar claro que não detêm o monopólio na pretensão ao universal. Diversos outros países — a França, a Grã-Bretanha, a Alemanha, a Espanha, o Japão, a Rússia — exerceram, ou tentam ainda exercer, nos seus círculos de influência, formas de imperialismo cultural bastante semelhantes. A grande diferença é que, pela primeira vez na história, um único país se encontra em posição de impor o seu ponto de vista ao mundo inteiro.
[4] Cf. Ringer, Fritz. The Decline of the Mandarins. Cambridge University Press, Cambridge, 1969.
[5] Bourdieu, Pierre. Les Conditions Sociales de la Circulation Internationale des Idées. Romanistische Zeitschrift für Literaturgeschichte. 14 -1/2, Heidelberg, 1990, p. 1-10.
[6] Alodoxia: o fato de tomar uma coisa por outra.
[7] Assim como a globalização das trocas materiais e simbólicas, a diversidade das culturas não data do século actual, já que ela é co-extensiva à história da humanidade, como haviam observado já Émile Dürkheim e Marcel Mauss na sua “Note sur la notion de civilisation” (Année sociologique, nº 12, 1913, p. 46-50, III vol., Éditions de Minuit, Paris, 1968).
[8] Cf. Dixon, Keith. Les Évangelistes du marché. Raisons d'agir Éditions, Paris, 1998.
[9] Em relação à “globalização” como “projecto norte-americano” visando a impor o conceito de “valor-acionário” da empresa, ler, de Neil Fligstein, “Rhétorique et realités de la “mondialisation”, Actes de la recherche en sciences sociales, Paris, nº 119, setembro de 1997, p. 36-47.
[10] Estes trechos foram retirados do catálogo de definições escolares de suas teorias e opiniões políticas que Anthony Giddens propôs ao programa “FAQs (Frequently Asked Questions)”, no seu site na Internet.
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[*] Pierre Bourdieu, do Collège de France , é autor de A Reprodução – Elementos para uma Teoria do Sistema de Ensino; Razões Práticas; Economia das Trocas Simbólicas , entre outros.   Löic Wacquant, da Universidade de Berkeley, é autor de As Prisões da Miséria; Punir os Pobres , entre outros.

O original em português encontra-se na Revista Possibilidades , publicação do NPM - Núcleo de Pesquisa Marxista. Ano 1, num. 1, Jul./Set de 2004. páginas 24-28.
Tradução de Teresa Van Acker; revisão de Rui Bebiano. 


Este artigo encontra-se em http://resistir.info .

quarta-feira, 22 de maio de 2013

[Crise da civilização técnico-científica] Só um Deus nos pode salvar ( Leonardo Boff)

20.05.13 - Mundo
[Crise da civilização técnico-científica] Só um Deus nos pode salvar

Leonardo Boff
Teólogo, filósofo e escritor
Adital
A crise de nossa civilização técnico-científica exige mais que explicações históricas e sociológicas. Ela demanda uma reflexão filosófica que desemboca numa questão teológica. Quem o viu claramente foi Martin Heidegger (1889-1976), antes mesmo que tivesse surgido o alarme ecológico.
Numa famosa conferência em 1955 em Munique "Sobre a questão da técnica” na qual estavam presentes Werner Heisenberg e Ortega y Gasset, ele tornou claro o risco que o mundo natural e a humanidade correm quando se deixam absorver totalmente pela lógica intrínseca deste modo de pensar e de agir que intervém e manipula o mundo natural até às suas últimas camadas para tirar benefícios individuais ou sociais. A cultura técnico-científica penetrou de tal forma na nossa autocompreensão que já não podemos entender a nós mesmos nem viver sem essa muleta que introjetamos em nosso próprio ser e estar-no-mundo.
Ela representa a convergência de duas tradições da filosofia ocidental: a platônica de cariz idealista transfigurada pela incorporação cristã e a aristotélica, mais empírica que está na base da ciência. Elas se fundiram no século XVII a partir de Descartes e fundaram a moderna tecno-ciência moderna, o paradigma dominante.
O interesse desse modo de ser é como são as coisas, como funcionam e como nos podem ser úteis. Não é o milagre de que as coisas são, confrontadas com o nada. Separamo-nos do mundo natural para entrar profundamente no mundo artificial. Perdemos a relação orgânica com as coisas, as plantas, os animais, as montanhas e com os próprios seres humanos. Tudo se transforma em instrumento para alguma finalidade. Não vemos o ser humano, como pessoa, portadora de um propósito, mas a sua força de trabalho, seja física seja intelectual que pode ser explorada.
Se algo pode ser feito, será feito sem qualquer justificação ética. Se podemos desintegrar o átomo não há porque não fazê-lo e construir uma bomba atômica. Se podemos lançá-la sobre Hiroshima e Nagasaki quem o impedirá? Se posso manipular o código genético, não há limite moral ou ético que o possa coibir. E fazemos as experiências que acharmos interessantes e úteis para o mercado e para certa qualidade de vida.
Heidegger nos adverte que esta tecno-ciência criou em nós um dispositivo (Gestell), um modo de ver que considera tudo como coisa ao nosso dispor. Colonizou todos os espaços e subjugou todos os saberes. Transformou-se num motor que se acelerou de tal forma que já não sabemos como pará-lo. Tornamo-nos reféns dele. Ele nos dita o que fazer ou deixar de fazer.
Neste ponto Heidegger aponta o altíssimo risco que corremos como natureza e como espécie. A tecno-ciência afetou as bases que sustentam a vida e criou tanta força destrutiva que nos pode exterminar a todos. Os meios já foram construídos e estão aí à nossa disposição. Quem segurará a mão para não deslanchar um armagedon natural e humano? Essa é a questão magna que nos deveria ocupar como pessoas e como humanidade e menos o crescimento e as taxas de juros.
A resposta tentada por Heidegger é uma Kehre, uma ”Volta”que significa uma revira-Volta. Este é o propósito final de todo o seu pensamento, como o revelou numa carta a Karl Jaspers: ser um zelador de museu que tira a poeira sobre os objetos para que se deixem ver. Como filósofo se propunha (pena que usa uma linguagem terrivelmente complicada) remover o que encobre o habitual e o cotidiano da vida. Pela sofisticação técnico-científica ele ficou esquecido, abstrato ou enrijecido. Ao fazer isso o que se revela então? Nada senão aquilo que nos rodeia e que constitui o nosso ser-no-mundo-com-os outros e com a paisagem, com o azul do céu, com a chuva e com o sol. É deixar ver as coisas assim como são; elas não nos oprimem mas estão, tranquilas, conosco em casa. Foi buscar inspiração para esse modo de ser nos pré-socráticos particularmente em Heráclito, que viviam o pensamento originário antes de se transformar com Platão e Aristóteles em metafísica, base da tecnociência.
Mas suspeita que seja tarde demais. Estamos tão próximos do abismo que não temos como voltar. Na sua última entrevista ao Spiegel de 1976, publicada post-mortem diz: "Só um Deus nos pode salvar”. A questão filosófica sobre o destino de nossa cultura se transformou numa questão teológica. Deus vai intervir? Vai permitir a autodestruição da espécie?
Como teólogo cristão, direi, como São Paulo: "a esperança não nos engana” (Rm 5,5) porque "Deus é o soberano amante da vida” (Sb 11,26). Não sei como. Apenas espero.